Doença ocupacional e concausa: saiba como evitar prejuízos milionários

Homem em exritório sentindo dores nos ombros por conta de doença ocupacional

Você sabia que sua fazenda ou empresa pode ser condenada a pagar indenizações mesmo quando a doença do trabalhador não foi causada exclusivamente pelo trabalho? Esse é um risco jurídico real, e o nome dele é doença ocupacional. O agravante: muitas vezes a empresa só descobre isso quando já está passando por um processo trabalhista.

Se você é empregador no setor rural, precisa conhecer este tema profundamente — não apenas para cumprir a lei, mas para proteger sua gestão e seu patrimônio.

O Que é Doença Ocupacional?

A doença ocupacional é aquela adquirida ou agravada em razão do trabalho. A legislação brasileira, especialmente o artigo 21 da Lei 8.213/91, equipara a doença ocupacional ao acidente de trabalho, com todos os efeitos decorrentes: estabilidade, indenizações, responsabilidade civil e previdenciária.

Ela pode ser classificada em duas formas:

Doença profissional: diretamente relacionada à atividade exercida, como intoxicações por defensivos agrícolas em trabalhadores do campo;

Doença do trabalho: causada pelas condições do ambiente, como má ergonomia, ruído ou jornada exaustiva.

O Que Isso Significa Para a Sua Empresa?

O reconhecimento de uma doença ocupacional acarreta diversas consequências:

• Estabilidade provisória no emprego por 12 meses após o fim do auxílio-doença acidentário (art. 118 da Lei 8.213/91);

• Indenizações por danos morais e materiais;

• Possibilidade de pensão vitalícia, em caso de redução permanente da capacidade laborativa;

• Manutenção de benefícios durante o afastamento, como plano de saúde e o FGTS;

• Risco de ações coletivas, fiscalizações e autos de infração, caso fique constatado o descumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho.

Responsabilidade Civil: Quando a Empresa Deve Indenizar?

A responsabilização da empresa pode ocorrer de duas formas:

Subjetiva: exige prova de culpa — negligência, imprudência ou imperícia;

Objetiva: nas atividades de risco, como exposição a agentes nocivos, eletricidade ou calor excessivo, não se exige culpa. Basta o nexo entre a atividade e o dano.

Para que o empregador seja condenado, normalmente são analisados três elementos:

1. Dano: prejuízo físico, psicológico ou econômico ao trabalhador;

2.Nexo causal: relação entre a doença e o trabalho;

3. Culpa: conduta omissiva ou comissiva da empresa, como falta de EPI, jornadas exaustivas ou ausência de prevenção.

Danos Morais e Materiais: Quanto Pode Custar?

Dano moral: é presumido. Basta comprovar a doença e o nexo com o trabalho — não é preciso provar sofrimento psicológico. A indenização visa compensar o trabalhador e educar a empresa.

Dano material: inclui gastos com tratamentos, perda de capacidade laboral, lucros cessantes e até pensão vitalícia, prevista no art. 950 do Código Civil. O valor depende do salário do trabalhador e do grau da incapacidade. Se pago à vista, é aplicado um deságio entre 20% e 30%.

Concausa: O Fator que Pode Reduzir a Responsabilidade da Empresa

Um conceito crucial — e muitas vezes ignorado — é o da concausa. Ela se refere aos casos em que o trabalho não foi o único causador da doença, mas contribuiu para seu surgimento ou agravamento.

Exemplo prático:

Um trabalhador com predisposição genética à hérnia de disco desenvolve agravamento da lesão ao executar trabalho braçal. O trabalho não causou a doença, mas piorou o quadro. Nessa hipótese, o juiz pode reconhecer a responsabilidade da empresa de forma atenuada, reduzindo o valor da indenização proporcionalmente à sua contribuição.

A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) já reconheceu indenizações limitadas a 50% da perda funcional, quando a responsabilidade da empresa não foi integral.

Como o Produtor Rural Pode se Proteger?

1. Invista em prevenção: ofereça EPIs, promova treinamentos periódicos, acompanhe as condições ergonômicas e mantenha registros atualizados.

2. Controle médico e documental: exames admissionais, periódicos e demissionais são provas essenciais para evitar fraudes e fortalecer a defesa da empresa. Mas, atenção, esses exames precisam ser bem feitos.

3. Mapeie riscos por setor: identifique tarefas de maior esforço físico, exposição química ou risco psicológico. Atue com foco na gestão de pessoas e segurança jurídica.

4. Tenha assessoria jurídica preventiva: conte com advogados especializados para atuar antes que o problema vire processo, especialmente em demandas ligadas à saúde ocupacional e passivo trabalhista.

Conclusão

Doença ocupacional não é apenas um problema de saúde — é um risco jurídico sério e evitável. Conhecer as obrigações legais e os direitos do trabalhador não é apenas dever: é estratégia de gestão para quem quer longevidade no negócio rural.

Seja com ações preventivas, estrutura documental sólida ou defesa qualificada, proteger sua empresa começa pela informação correta. E no agronegócio, onde as condições de trabalho muitas vezes envolvem esforço físico, exposição e sazonalidade, esse cuidado é ainda mais necessário.

Ana Paula Rezende Souza

Advogada, sócia proprietária