A falsa segurança do produtor rural
Muitos produtores rurais ainda acreditam que, por nunca terem enfrentado uma ação trabalhista, estão imunes a esse tipo de problema. Mas essa é uma falsa sensação de segurança. Basta uma única reclamação ajuizada por um ex-funcionário — mesmo um que tenha trabalhado por poucos dias — para colocar em risco o patrimônio da fazenda, a tranquilidade da família e a estabilidade do negócio.
A Justiça do Trabalho é célere e, muitas vezes, implacável quando o empregador não está adequadamente preparado. E nesse cenário, o produtor que não leva a sério a organização trabalhista acaba assumindo o custo da própria negligência.
A importância da prevenção e da documentação
A chave para não ser surpreendido está na prevenção e na organização documental. Embora a regra geral do processo do trabalho determine que cada parte deve provar aquilo que alega — ou seja, o trabalhador prova o fato que fundamenta seu direito, e o empregador prova o fato que impede, modifica ou extingue esse direito — na prática, essa divisão de responsabilidades é constantemente relativizada.
Em especial no meio rural, onde os trabalhadores muitas vezes não têm acesso à informação, aos documentos e tampouco formação suficiente para apresentar provas técnicas, os juízes tendem a aplicar o princípio da proteção ao hipossuficiente e inverter o ônus da prova em favor do empregado.
Isso significa que, mesmo quando o dever de provar seria do trabalhador, o empregador poderá ser condenado simplesmente por não ter feito a documentação correta do vínculo, das jornadas ou da segurança no ambiente de trabalho.
A falta de provas e o risco de condenação
Em casos envolvendo horas extras, por exemplo, a ausência de controle de jornada válido (e não apenas folhas de ponto genéricas assinadas de forma mecânica) pode fazer com que o juiz presuma verdadeira a jornada alegada pelo trabalhador na petição inicial.
O mesmo vale para alegações de ausência de equipamentos de proteção, exposição a agrotóxicos, alojamentos insalubres ou transporte precário. Sem provas concretas em sentido contrário, a fazenda corre o risco de ser condenada mesmo tendo cumprido com suas obrigações — apenas porque não soube documentar.
Por isso, uma das frases mais verdadeiras no direito do trabalho é: “Não basta ter razão; é preciso conseguir provar que tem razão.”
Provas se constroem no dia a dia
A produção de provas em favor da fazenda precisa ser planejada e contínua. Começa com um contrato de trabalho claro, mesmo nos casos de trabalhadores temporários ou safristas. Passa por registros adequados de jornada, controle de ponto, recibos de pagamento com detalhamento completo, entrega de EPIs com assinatura, registro fotográfico da aplicação de treinamentos, programas de prevenção de riscos atualizados e exames médicos em dia.
Sem esse arsenal mínimo, a defesa em juízo fica fragilizada e o custo de uma condenação pode ser muito maior do que o valor que se economizou ao deixar de se organizar.
Medicina e segurança do trabalho como prioridade
Além disso, o cuidado com medicina e segurança do trabalho deve ser absoluto. Os maiores passivos no campo decorrem de acidentes e doenças ocupacionais.
Um acidente grave, como amputações, quedas ou intoxicações, pode gerar, além de indenizações milionárias, repercussões criminais e investigações por condições análogas à escravidão, especialmente quando há ausência de registros, de alojamentos adequados ou de medidas preventivas.
A NR-31, que regula o trabalho rural, é clara quanto às obrigações do empregador. Ignorá-las é expor o negócio a riscos desnecessários.
Um advogado ruralista é parte da estratégia
É por isso que a contratação de um advogado especializado no setor rural não deve ser vista como medida de emergência, mas como estratégia de gestão.
O profissional que atua no campo conhece a realidade das fazendas, compreende a lógica das safras, das contratações por período e das dificuldades de lidar com legislação, muitas vezes pensada para ambientes urbanos. Ele atua preventivamente, orientando o empregador, treinando lideranças, auditando rotinas e organizando documentos que farão toda a diferença em uma eventual audiência.
Em resumo, o produtor rural que deseja dormir tranquilo precisa entender que a melhor defesa trabalhista é aquela que se constrói antes do primeiro processo.
A ação trabalhista é uma realidade cada vez mais comum no campo, e enfrentá-la sem preparo é assumir um risco desnecessário. Organize-se. Documente tudo. E conte com quem entende do seu chão.